quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

DIVAGANDO RUBEM ALVES

Leio o Rubem devagar, é preciso sorvê-lo, ler não basta.
Às vezes preciso voltar atrás quando alguma coisa me fere demais e entristeço de ver minhas concepções infantis se desmanchando: amo a mim através do outro.
Que chato! Eu queria amar o outro diferente de mim! Mas talvez fosse uma invasão e assim é que está certo. Já escrevi que amamos o outro porque não podemos amar direto a Deus, ao nosso espírito imortal. Ou qualquer outra coisa externa e grande
Também volto a reler ao ficar feliz de reconhecer já ter feito tantas dessas sabedorias, se é que servem para alguma coisa.
Lembro-me do texto que escrevi quando abateram o guapuruvu que enxergava da minha janela e com quem conversava todas as manhãs. O consolei na morte iminente a cada galho tombado. Ele que era tão orgulhoso e feliz com sua beleza e elegância.
Depois chorei a perda de meu amigo árvore e para sempre reconheci suas sementes quando as encontrava. Recebi uma qualquer de presente e fiz de conta que eram dele. Afinal, todas as sementes de guapuruvu pertencem a mesma espécie porque suas almas de planta são unas e indivisíveis e, se morrem, não sentem a dor que sentimos sabendo que continuarão vivas em suas iguais.
Lembro que imitava o Chiquinho (o de Assis que amo incondicionalmente, como ele ensinou) dando bom dia céu, bom dia sol, ou chuva até mesmo antes de escovar os dentes.
Lembro que arrancava capim-navalha do meio da grama pensando que ele era muito ardiloso, pois escorregava as raízes por baixo das outras para brotar logo adiante e sobreviver do meu arrancar e matar. Ele enganava a famigerada morte.
Deveria por datas no que escrevo senão sempre parecerá que escrevi depois que aprendi e muito pelo contrário, o aprender é absolutamente atual. Diário.
Foi assim que lembrei de um conto escrito em Bombas quando tinha onze bebedores para beija-flor e ficava sentada olhando sua guerra. Os beija-flores são muito belicosos, sabias? Lutam defendendo seu território. Descobri nesse belo tempo, onde não existia tempo e sobrava tempo para aprender as coisas imensamente sérias da vida: dos pequenos animais, do lindo jardim que eu tinha.
Existiu outro, perdido, se é que se pode perder algum texto já que ficaram escritos dentro de mim e talvez de algumas pessoas que leram, onde eu acompanhava formigas lá em Canela, no Rio Grande do Sul e me sentia uma delas e as compreendia.
Houve também aquela experiência no Beira-Mar Shopping, de Floripa, quando nem sonhava em morar na Ilha da Magia. Olhei as pessoas com um sentimento estranho e forte de que todas eram uma individualidade fantástica e pulsavam igual a mim, sendo também eu. Um sentimento de unidade tão grande que nem eu, amante das letrinhas, consigo descrever. Um paradoxo: uma unidade absolutamente cabível na individualidade.
Por causa dessas coisas todas foi que comecei a pensar que era maluca e agora, parte delas, o Rubens diz que também malucou. Encontro então, outro maluco e não me sinto tão deslocada nesse mundo que é de Deus.
Não é porque Ele está tão esquecido, perdido dentro das garrafas de Coca-cola e outras tantas coisas inúteis. Se é que Ele existe, não o tenho visto ultimamente.
Ontem eu pensei muito tempo que não estava me importando com a opinião de ninguém porque eu podia ser eu em paz e dar uma banana para as opiniões.
Pensei no meu amigo que se esforça para me convencer dos caminhos a percorrer, quando sei que já trilhei tantos. Agora desejo o meu próprio que seguirá outras marcas, mas provavelmente não as seguirá de forma inexorável e mais pularei amarelinha entre eles.
Até quis escrever, mas estava com sono. Escrevi mais tarde, não saiu do jeito que pensei no travesseiro. Outro amigo colocou no site mesmo assim. Ainda riu de mim quando desejei que o conto passasse na triagem e me respondeu que os meus sempre passam e isso também é estranho. Acho que só eu posso sentir realmente o que escrevo, são bons apenas aos meus olhos. No entanto, tive um amigo que chorara me lendo, ou se identificara. Então é uma tremenda pretensão imaginar que só eu sinto as coisas, tenho apenas a capacidade de transcrevê-las e foi o pessoal lá de cima que me deu isso, não fui eu que criei nada.
Acaba que isso é quase uma crônica e talvez eu possa arrumar a forma e jogar no espaço da Internet.
Tenha um lindo dia nublado porque eles também são lindos com seu alívio ao calor e, às vezes penso que sou meio sapo, pois sinto saudades desses dias quando demoram a voltar.





Vana Comissoli 01/2008

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